A SIMPLICIDADE DA CONFUSÃO
Sobre Le Petit Soldat (Jean-Luc Godard, 1963)
"Para mim, o tempo da ação já passou. Envelheci. Começa agora o da reflexão". Para Godard, como para o "pequeno soldado" Bruno Forestier, já passou o tempo de À bout de souffle, cujo furor é sucedido pela interrogação sobre este furor. Le petit soldat quer ser – e, à primeira vista, é – um filme simples, porque é um filme sem raiva, um filme mais "sábio", um filme que despede-se com uma declaração de paz: Genebra, a cidade neutra, o ambiente adequado para se pôr as cartas na mesa, olhar-se no espelho, transformar este espelho em tela, olhar os espectadores, entregar-se a estes sem mediações, sem fábulas, tentando aproveitar os níveis estilísticos complexos e contraditórios de À bout de souffle (e de Une femme est une femme, Bande à part, Pierrot le fou) pelo menos tanto quanto as máscaras do cinema noir ou musical. A simplicidade de Le petit soldat é análoga à de Vivre sa vie, de Une femme mariée, de Masculin féminin, isto é, dos filmes em que Godard entrega-se com menos dificuldade, os filmes em que, entre a arte (o cinema) e a vida, parece escolher mais francamente a vida. Este fato traduz-se, na prática, em uma linearidade narrativa (continuidade da ação; tendência à "objetividade", graças à mediação do personagem onipresente em sua concretude) e técnico-estilística (montagem não-deformadora, tornada compreensível na medida em que é guiada pelo olhar do protagonista; voz-off modulada segundo o princípio tradicional do comentário paralelo ao fluir das imagens, não explicativo), que porém nunca é fruto de uma escolha "primária", como nos melhores clássicos americanos ou em Rossellini, mas de uma escolha intelectual: a tendência a um cinema "denotativo" que pode ser destacada em Le petit soldat não é, em suma, o resultado de uma construção, mas de uma gradual redução a partir de um cinema fortemente "conotativo" (cujo exemplo-limite é talvez Pierrot le fou). "De onde, onde, para onde"; Le petit soldat poderia ter como subtítulo: a simplicidade da confusão. Mais uma vez, a escolha estilística – aparentemente capaz de resolver qualquer conflito – concretiza a tentativa de Godard de afrontar contraditoriamente a matéria pré-escolhida, recusando a (cômoda) mímesis da linguagem para com o objeto representado, contestando-o, de modo a sobrepor à arte o juízo sobre a arte. A simplicidade é na realidade uma tensão à simplicidade; o rosto impassível de Michel Subor, sobre o qual tudo escorre num mesmo nível, é o de um Pierrot imóvel, que aprendeu a relegar para dentro de si o grito e a fúria, que interroga-se sem esperar uma resposta, portando consigo apenas a vontade de percorrer o arco da realidade de um extremo ao outro. Como o Paul de Masculin féminin, Bruno Forestier aceita tudo, aceita demasiado, mas, diferentemente de Paul, não possui ideais, não possui herança portanto, preso ao presente, cúmplice das suas mutações, pronto para vivê-las. "Eu era ainda muito estúpido e muito jovem". Godard acompanha Bruno ao longo de seu itinerário, e ao observá-lo observa a si mesmo, julga a si mesmo, unido ao personagem por uma relação de projeção/descolamento que lhe permite fazer um filme subjetivo e objetivo ao mesmo tempo: visto do interior, por força de ser visto do exterior. Godard elimina a mediação estilística para substituí-la por uma única e outra mediação: a do personagem "metteur en scène", que ele regula e pelo qual, simultaneamente, ele se deixa ser regulado, conservando sobre a tela a coexistência de vários pontos de vista contraditórios – característica dominante de todo o seu cinema –, recusando-se a operar uma escolha, filmando a con-fusão dos significados. Para irmos no detalhe, veja-se o duplo nível de leitura que verifica-se quando sobre a tela sobrepõem-se de um lado os olhares fragmentários de Bruno sobre Genebra ou sobre os passageiros de um trem (planos independentes um do outro, mônadas autossuficientes que são a manifestação externa da confusão interna de Bruno, isto é, do seu "compromisso" com a realidade e da sua disponibilidade) e, do outro, o olhar unitário de Godard sobre Bruno, unitário enquanto um olhar contínuo, ligado a um comportamento objetivo, não interrompido anti-realisticamente no plano da continuidade espaço-temporal. Na permanência deste olhar (isto é, desta máscara harmônica que Godard sobrepõe para contestar a – e proteger-se da – confusão), a tensão que move o filme é a mesma que impele Bruno a preencher o espaço entre ele mesmo e os outros (a sensação de estar separado da realidade, o cansaço e a amargura de Franz e Odile na autoestrada, no fim de Bande à part: a poesia de Aragon cantada por Odile): Bruno encontrou Véronica, com a boca de Leslie Caron e saída de uma comédia de Giraudoux, e apaixona-se pelo seu jeito de balançar os cabelos. Em busca da verdade (e Godard, com o cinema, em busca da verdade vinte e quatro vezes por segundo), Bruno fotografa Véronica, sem compreendê-la, porque quer negar-lhe a aparência para apanhar-lhe a alma. Bruno não entende que Véronica é o que é, a claridade externa que ele busca dentro de si, clareza do gesto que ele tenta inutilmente multiplicar em busca de alguma outra coisa – de si mesmo – e clareza de ideias, isto é, presença de um ideal, de uma fé política, a que Bruno aspira mas que ele repele ao mesmo tempo: "existe algo mais importante do que ter um ideal, mas o quê?", ele pergunta a si mesmo, denunciando a tensão que anima Godard, que quer superar tanto a confusão (a modernidade) de Bruno quanto a clareza (o classicismo) de Véronica, em busca do quê? Talvez, daquela realidade cinematográfica, aquela indefinível sensação de dissolução da divisão tela/vida que Masculin féminin revela mais do que qualquer outro filme seu... "Talvez, no fim das contas, fazer perguntas é mais importante do que encontrar respostas". Bruno confronta-se com as imagens da guerra, da violência moderna, que tem coladas na parede de seu quarto, como Godard "cola" citações literárias, pictóricas e cinematográficas nos seus filmes. O medo e a covardia não são mais que a dificuldade da escolha, não são uma espera passiva, uma recusa, mas uma espera ativa, aquela de quem, talvez de forma absurda, deseja compreender tudo antes de afirmar alguma coisa. A tortura, "monótona e triste", é o confronto inesperado e material com a própria confusão, e a resistência é a tentativa de dar um sentido a esta confusão. Por trás de tudo isso está presente Godard, que tortura Bruno para torturar a sua parte de idealismo absurdo, e o salva ("têm-se sempre a sorte que se merece") para premiar, isto é, para dar um possibilidade de realização, às suas hesitações (aquele "quê" que está além do ideal). É a distância crítica de Godard, o seu "juízo", aquele empenho que os idealistas de direita ou de esquerda o repreenderam por supostamente não o ter. Não é, portanto, a falta de juízo o que deve ser repreendido em Godard, que aliás oferta a cada um o seu (aos idealistas de direita ou de esquerda assim como aos confusos da terra-de-ninguém), mas sim a estilização desta direita e desta esquerda, mais godardianas do que realistas (mas Godard nos quer falar da realidade ou de si mesmo? A minha é uma falsa objeção, da mesma forma que seria enganoso repreender o comunismo poético de Prima della rivoluzione, que não serve bem à realidade, mas muito bem aos propósitos do autor). Bruno, então, salva-se (Godard o salva) para poder tentar novamente romper com o isolamento, após o fracasso do primeiro encontro com Véronica. Desta vez, o confronto se dá não com a mediação da imagem (a máquina fotográfica), mas com a da palavra. O que bastaria para esclarecer o quanto essa interrogação de Bruno sobre si mesmo e sobre a própria confusão é, também, uma interrogação de Godard sobre o próprio cinema e sobre o "medo" de que falava em uma reveladora resenha de Montparnasse 19. Eis, portanto, em um plano-sequência (a continuidade espaço-temporal que garante a ausência de reconstrução), uma fono-sequência, uma continuidade de palavras que se acumulam, se contradizem, se misturam dando forma a uma confissão irritante (para quem souber ver nela o branco e o preto), comovente e autêntica para quem a aceita não como solução, é claro, mas como tensão à solução. "Talvez as pessoas falem sem parar, como garimpeiros, para encontrar a verdade. Ao invés de remexer o fundo de um rio, remexem o fundo dos próprios pensamentos". O caminho de Bruno rumo à verdade é como o de Godard, que obstina-se em filmar para chegar à verdade, à vida (a Masculin féminin?). Depois, Véronica, que possui um ideal, morre pelo (do) seu ideal, logicamente, segundo a lógica de Godard, para quem a vida pertence aos mutantes. Bruno, igualmente logicamente, pela mesma lógica, (sobre)vive. "Me resta uma única coisa: aprender a não ser amargo. Mas estava contente porque tinha muito tempo pela frente".
– ADRIANO APRÀ
Cinema & Film #1, Inverno 1966-67.
Traduzido do Italiano por Gabriel Carvalho.